sobre a autora

Sax

segunda-feira, 23 de março de 2009


Bem ao lado da minha janela tem um cara que toca sax.
Na verdade, não sei se ele faz aula, dá aula ou simplesmente toca pelo prazer de tocar. Só sei que todo dia, a partir das 5 da tarde e até sabe lá Deus que horas, ele dedilha o seu instrumento de forma tão doce.
Talvez seja um exibicionista; talvez alguém apenas descobrindo o próprio talento. Mas o fato é que hoje a minha dor de cabeça de apertar os rins passou só depois de ouvir aquelas notas. Não bastou dois remédios nem pomada, mas o som entrou lá no cérebro, rodopiou a cabeça inteira e disse para a testa parar de doer. Como será que é esse curandeiro?
Já me pendurei na janela em busca desse rosto. Será novo ou velho, pardo ou chinês? Mas a gente sempre imagina, né, e a fantasia é toda vez tão melhor que a realidade, quase sem exceções. Pois bem. O meu saxofonista é baixo. Eu prefiro homens altos, mas o sax do meu instrumentista chega quase a bater no seu umbigo. E os braços são longos, pois com eles o cara percorre aquele cano comprido quase sem dificuldade.
O meu saxofonista é moreno, de cabelo encaracolado e bem curto. Ele não tem muito o que fazer da vida, então toca para se alegrar. Está, atualmente, ensaiando para um concerto que ainda não sabe se vai protagonizar – sabe como é, decisões do maestro. Então ele acorda cedo, pega a maleta com o meio de vida e sobe no primeiro ônibus da Teodoro. Lá dentro ele passa, nota por nota, toda a melodia na cabeça. Imagina qual detalhe vai acrescentar à performance de hoje e matuta o que pode fazer para o mestre, enfim, reparar que ele dá tão duro. E dá mesmo. Até as 4, ele ensaia sem parar para a peça no Municipal – que oportunidade! Mas quando chega em casa, cansado e com tanto trabalho na cabeça, ele só consegue relaxar se for bolando outras músicas, compondo por caminhos totalmente diferentes.
Quem sabe, no prédio ao lado – ele pensa – não está algum musicista que enfim vai descobrir que ele pode tanto mais. Quem sabe.

2 comentários:

Unknown disse...

Cara, eu tinha um pianista assim quando era bem mais nova, sabe? Até que descobri que era um vizinho gordinho que morava aqui hehehe Realmente, a fantasia é sempre melhor que a realidade.

Tanit Savassi disse...

adorei o texto... quanta delicadeza para escrevê-lo.