sobre a autora

O desapego do sobrevivente

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Agora eu dei para me emocionar com qualquer coisa. Mas assim, realmente não precisa ser nada demais. Comoção, medo, angústia, ansiedade, tudo é motivo de pequenas lagrimazinhas que não tem quem segure. Uma amiga disse: "Você tem que saber deixar as coisas e as pessoas irem embora". Um amigo falou que eu tinha crescido muito nesse tempo que passei fora. Um escritor relatou a distração típica das motoristas paulistanas que se maquiam, ouvem música e desviam de caminhões ao mesmo tempo. Pela primeira vez, eu pensei em como será ficar realmente sozinha. Durante a mudança, sumiram duas saias e um vestido de que eu gostava muito. Minha amiga de infância virou mestre. Parei para refletir e vi que não tenho frilas engatados e minha carreira como jornalista está suspensa por tempo indeterminado. O apelido que virou nome vai voltar a ser só apelido. Resignada com minhas novas demandas, minha mãe observou que eu já não sou mais a mesma.

Estava com preguiça dessa sensibilidade que viria. Começou quando tirei os postais da parede. Sempre que ia a restaurantes self-service, salões, vernissages, ficava maravilhada com aqueles pequenos cartões tão bacanas e coloridos, que às vezes serviam de propaganda, ou de repente eram só objetos de decoração mesmo. Decidi recolher alguns que mais me chamassem a atenção. Com vários acumulados em casa, delirava à noite, antes de dormir, tentando achar uma solução sobre o que fazer com eles. Empilhá-los na parede fina que fica depois das margens do armário, me disse um breve insight. Pronto. Até meus amigos começaram a separar para mim quando voltavam de viagem ou viam alguns interessantes em qualquer lugar. Na hora de encaixotar as coisas, percebi que deveria tirar os postais dali. Como eu imaginava, a parede ficou cheia de marcas de durex. Azar. Foi antes da metade que eu apoiei o braço direito e tentei conter o choro incontível. De despedida.

O ócio de ficar em casa sem trabalho já me tirou do sério. Hoje não mais. Tento entender que simbolismos vou levar e escolher quais eu preciso deixar para trás. Tento redescobrir o significado da palavra férias, coisa que eu nunca soube o que é no sentido literal, e que eu ensaio mais uma vez. Me afogo na desorganização que tomou conta do meu quarto e tenho usado as mesmas roupas por autoprotesto contra a minha falta de assiduidade. Reverei filmes que nunca me fizeram muito sentido só para ocupar a cabeça com outra coisa, e pode apostar que todos os segundos que eu tiver por aqui serão pensados, elaborados, aproveitados e saboreados de acordo com sua devida importância. Um relaxamento mental que não acontece na prática, mas que é absolutamente o máximo que eu posso fazer.

Dali da piscina aquecida, que suga as minhas forças e me dá um sono incontrolável todas as noites, eu reflito sobre as mudanças da vida. Em pequenos encontros, acho justificativas para ligar a pessoa que fui à que me tornei. E neste período de entressafras, não tenho exigido muito mais de mim mesma além de paciência e conformidade com o rumo da vida. Tolerância com as consequências das nossas escolhas. Peito aberto para as maravilhas que estão por vir. Medo das dificuldades que aparecerão. E quando não entendem, me afogo no livro de Camus, onde encontro todas essas explicações sintomaticamente aplicadas. Não, eu não preciso ter receio de chorar. Não mais. Porque é preciso se desapegar do passado e levá-lo junto ao mesmo tempo. E uma hora, mais cedo ou mais tarde, mais tarde provavelmente, eu vou aprender como se faz isso. E dizer que, na verdade, foi muito mais fácil e gostoso do que parecia no começo.

1 comentários:

mm disse...

Se coisas boas se vão é para que coisas melhores possam vir. Esqueça o passado, desapego é o segredo!